Cena do filme Sabrina. Um clássico. Audrey Hepburn cantando La Vie en Rose. Eu definitivamente nasci na época errada.
vendredi 25 janvier 2008
mardi 22 janvier 2008
un coup de souflle...

A saudade se conjuga no passado
O amor se conjuga no presente
A saudade é o amor distante,
Geograficamente,
Cronologicamente
Ou simplesmente
O amor quando se cadaveriza
Se transforma numa saudade
Recém-nascida
O amor nasce, cresce
e depois morre
A saudade é eterna, nasce, cresce
E depois cresce
E depois cresce
O amor quando se sente só,
É triste,
Quando se sente os dois,
É doce
A saudade quando se sente só,
É triste,
Quando se sente os dois
É triste
Ama-se o imaginário,
Que depois que transformou-se em realidade,
Virou saudade
O amor é um grito
de alegria ou de pavor
O amor se conjuga no presente
A saudade é o amor distante,
Geograficamente,
Cronologicamente
Ou simplesmente
O amor quando se cadaveriza
Se transforma numa saudade
Recém-nascida
O amor nasce, cresce
e depois morre
A saudade é eterna, nasce, cresce
E depois cresce
E depois cresce
O amor quando se sente só,
É triste,
Quando se sente os dois,
É doce
A saudade quando se sente só,
É triste,
Quando se sente os dois
É triste
Ama-se o imaginário,
Que depois que transformou-se em realidade,
Virou saudade
O amor é um grito
de alegria ou de pavor
A saudade é um suspiro sempre
De dor
Quem não tem saudade
não viveu
e quem não tem amor
ainda não nasceu
By me
Perfil

Pretendo que este texto seja curto. Ele é tão pessoal que eu tenho quase vergonha de escrevê-lo, apesar de não ter nada de vergonhoso nele.
Eu sou uma pessoa fria e na maior parte do tempo bem-humorada. Raríssimas vezes na vida eu me acabei de chorar, talvez 2 ou 3 no máximo, contando com a infância. Já me apaixonei algumas vezes, mas soube digerir preocupantemente bem a perda. Sofri? Sim, claro. Por uma semana. Depois voltei à minha vida normal. Isso não quer dizer que eu não tenha sentimentos. Eu os tenho, eles são contidos.
Saudade é uma excessão, eu sinto muita. Não me pergunte de quê, são muitas saudades diferentes e emboladas umas nas outras. Porém, isso é assunto pra muitas outras discussões acompanhadas de Buscopan.
Eu tenho uma vontade insaciável de viajar e conhecer o mundo. Talvez se um dia eu conhecer cada país do mundo, cada pessoa e cada comida, eu ainda assim não me satisfaça. Eu gosto da minha família, mas não tenho nenhuma necessidade de estar geograficamente perto dela o tempo inteiro. Não sou como todas as pessoas (absolutamente todas) que me reportam experiências no exterior e que dizem que “morreram” de saudades da família, dos amigos e etc. Eu não sou assim. Sinto saudades sim, mas não é nem de longe algo que se torne o mais importante numa experiência de longa duração em outros mares. Esse apego católico-latino à família e ao drama definitivamente não está no meu sangue. Por isso eu me considero frio. Ou melhor, me consideram frio. Eu me considero sensível e cheio de sentimentos, embora a lataria não revele o que se passa no motor. Será que é errado ser assim? Sou imoral, psicopata, frio, cruel ou qualquer outro adjetivo de conotação negativa por isto? Eu penso que não.
Por isso não confie em mim. Eu sou dissimulado e fingido quando quero. Posso te encher de sorrisos sendo que eu te odeio na verdade. Eu não faço isso. Já fiz menos vezes do que chorei. Gosto de deixar claro quando não gosto de alguém. Mas não se engane. Se eu precisar e quiser, eu sei como e vou fazer. Eu também sei mentir muito bem. Eu sempre menti muito quando eu era pequeno, mas isso é normal pra uma criança eu acho. Mas eu entrei na fase adolescente como um grande mentiroso. Até que em um certo réveillon (já não me lembro o ano), eu prometi silenciosamente pra mim mesmo que nunca mais na vida mentiria, estava com vergonha de mim mesmo. Eu não parei de mentir totalmente, afinal é uma questão de sobrevivência. Porém eu diria que eu diminui uns 95%. O que eu considero muito bom. A questão é: eu tenho o savoir-faire da mentira, e vou usá-lo se necessário.
Eu tento ser bom o tempo todo com as pessoas em geral, principalmente com as que eu conheço. Respeito o trânsito de maneira obsessiva, principalmente quando o contrário possa prejudicar alguém. A faixa de pedestre é a metonímia maior do contexto geral de trânsito. Eu paro na faixa de pedestre, sempre. E nesse país de macacos selvagens que é o Brasil, eu sou provavelmente a única pessoa que faz isso. Me sinto bem quando dou um presente legal à alguém, tento ser gentil sempre. Gosto muito de quem é gentil comigo e com os outros também. Odeio muito a falta de educação e desrespeito gratuitos. Tendo a ser muito punitivo quando se trata de algo que eu não gosto. Não brigo quase nunca com ninguém, mas costumo exagerar quando acontece. Xingo todos os nomes, bato, aniquilo, chuto, sou violento, trucido com todas as minhas ferramentas pscicológicas e físicas. Mas só por um curto período de tempo. Depois eu esqueço, perdôo, mesmo o imperdoável. Eu tenho certeza que eu sou esquisito. Mas não me importo mais com isso. De certa forma até gosto disso em mim mesmo. Ser esquisito.
Eu sou assim. Já fui fiel e infiel às minhas namoradas. Mas sempre gostei de todas elas. Ainda gosto de todas elas. E vou gostar pra sempre.
Eu cojito sempre duas vidas distintas: a primeira mais “normal”, na qual eu acho uma menina legal, caso, tenho filhos, engordo e morro. A outra me soa mais excitante: voar solo a vida inteira, de porto em porto, de cama em cama (essa vida também terminaria como a primeira, engordar e morrer). É uma vida de livros e filmes, mas os sonhos não são mistérios para mim, já realizei vários e sei que vou realizar muitos outros. Por isso, é realmente uma questão de escolha, não de contentamento ou inércia. Essa vida nômade faz meus olhos brilharem, mas como dito antes eu sou frio. Por isto, não precisaria de muito pra que eu mudasse de idéia, e jogasse tudo isso fora sem que me fosse aflorado muitos sentimentos. Na verdade, eu tenho a impressão que lá na ultra profundidade do meu oceano eu não sinto. Eu sinto e “des-sinto” muito facilemente. Eu troco de sonhos como troco de cuecas.
Não sei, refletindo bem, eu acho que eu deveria usar essas característcas a meu favor. Deveria mesmo sair por aí, e mandar tudo pra ar. Mas eu também sou consciente das coisas da vida, como ter que ganhar grana pra poder comer macarrão e beber cerveja. E isso implica em gastar muitas e muitas e muitas horas da sua vida sentado fazendo algo que você detesta, chamado emprego. Já me lamentei por não ser filho de Bill Gates, de ter que me preocupar com esse pedaço de papel estúpido chamado dinheiro. Mas depois de muito pensar, eu não creio que eu seria feliz assim, vivendo a vida em um iate ao redor do mundo. Claro que seria ótimo, mas algo ia faltar, um desafio, uma conquista prórpria.
Por isso, eu creio que as chances de uma pessoa ser plenamente feliz são aumentadas quando ela trabalha e obtém prazer naquilo que faz. Como alguém sente prazer sendo um arquivista ou secretária, não me pergunte. Eu pessoalmente acredito que 99% das profissões deixam as pessoas infelizes e doidas pra voltar pra casa às 18:00h. Eu não estou fora disso. A engenharia é bonita, mas como é chato trabalhar com ela, meu deus! Que profissão árida e cheia de pessoas toscas! Eu gosto de engenharia, eu não gosto de trabalhar com engenharia. Eu bem que queria gostar, e é dificil dizer isso, mas eu não gosto, e ponto final. Eu exerço minhas funções como um robô, por questão de sobrevivência. Deixo meu coração e meus tesões no criado-mudo ao lado da minha cama de manhã e vou trabalhar. É assim que eu faço todos os dias. Considerando minha idade, pode ser que haja vários empregos interessantes ligados à engenharia que eu desconheça. Mas é difícil de acreditar.
Eu não vou fazer outro curso de graduação, porém estou pensando seriamente em me nortear pra um novo rumo num médio prazo. Fazer um curso que me desvincule o máximo possível da engenharia e que me permita viajar mais, morar em outros lugares: África, China, Islândia, Chile, Estados Unidos, Japão... qualquer nome que eu citar aqui vai me deixar igualmente excitado. Talvez me candidato a ser um epregado da ONU em missões de ajuda humanitária em países que só se fodem o tempo inteiro. Quem sabe ser um fotógrafo de guerra da National Geographic? Ou fazer uma expedição à Antártica pra pesquisar os piguins imperadores durante 2 anos. Bom, só sei que eu chego quase aos meus 27 anos ainda cheio de sonhos adolescentes e muita ansiedade de realizá-los.
Talvez eu faça como um amigo meu que quer ser marinheiro mercante ao invés de se prostituir pra uma empresa lotada de ovelhas bitoladas. Ou como um outro amigo meu que quer ser diplomata. Ou como uma menina da minha idade que eu li num jornal, que foi passar uns anos com uma tribo quase selvagem na amazônia pra aprender a língua deles.
Se eu chegar aos meus 60 anos de idade tendo vivido uma vida “comum”, todo bom mentiroso vai saber reconhecer na hora que a frase “é, eu tive uma vida feliz” é falsa.
Uma lobotomia talvez me fizesse bem.
PS: é, o texto não saiu curto afinal..
vendredi 18 janvier 2008
mardi 8 janvier 2008
Kastrup Airport

painting by Vladimir Dubossarsky
Pintado no Albergue da Juventude de Copenhague
Há um tempo estava eu no aeroporto de Kastrup em Copenhague, olhava as centenas pessoas que lá chegavam enquanto esperava minha vez de embarcar. Neste dia eu determinei que iria escrever sobre o que via naquele lugar. Porém esqueci. Esqueci de escrever, mas não do que vi. Ontem, proseando com uma amiga eu me lembrei desse dia, por acaso. A memória não é meu forte, então é provável que alguns detalhes importantes tenham se extinguido, mas o essencial eu guardei.
Pois bem. Eu acho fantástico lugares como aeroportos, rodoviárias, estações de trem e similares. Neste espaço físico dentro da cidade acontece milhares de cenas de novelas todos os dias. Encontros, desencontros. Milhares de pessoas chegam para uma nova vida, sabendo que nunca mais verão suas famílias. Se repararmos as pessoas nesses lugares, muitas estão olhando para o teto, para os carros, para as outras pessoas, contemplando aquele que pode ser seu novo lar para o resto da vida. “é que quando eu cheguei por aqui / eu nada entendi...” (Sampa de Caetono Veloso). Ou o contrário, alguns respiram seus últimos minutos daquela que foi sua casa desde moleque. Aeroportos e Cia são um banquete pra quem gosta de olhar pessoas. Eu gosto. É uma mina de acontecimentos fantásticos, dramáticos, corriqueiros, secos e molhados.
Mais emocionantes que ver alguém se despedir introspectivamente da terra natal ou de descobrir com olhos de criança uma nova vida, são as despedidas e os reencontros de pessoas com pessoas. No caso particular de Kastrup eu vi algumas cenas que se fixaram na minha memória espontâneamente. Vou descrever quatro. Seria mais apropriado na verdade chamar estas cenas de curtas-metragem. Isto porque são sequências de cenas que culminam em um final.
Nas 4 horas que eu deveria penosa e humildimente esperar para embarcar comecei a matar meu tempo olhando para seres humanos. A primeira pessoa que eu reparei foi um militar dinamrquês que iria recepcionar um outro militar dinamarquês que chegava do Iraque. Sim, a Dinamarca tem tropas no Iraque. Este militar dava uma entrevista à uma reporter em inglês e dizia ladainhas que não fiz questão de escutar. Do outro lado do saguão umas 40 pessoas esperavam o tal soldado chegar, cada uma delas com uma bandeirinha da Dinamarca na mão, que podia ser comprada por cerca de 30 Coroas Dinamarquesas (uns R$ 10) na banca ao lado. Creio que eram família e amigos. Faziam balbúrdia toda vez que uma leva de Homo Sapiens saia fresquinha do forno. Mas não, ainda não. Entre repórteres e bandeirinhas havia uma mulher, de cerca de 50 anos de idade, sentada, atenta ao saguão de desembarque. Já esperava havia tempo longo. Estava bonita, bem arrumada, mas nada demasiado, estava elegante. Usava uma saia até o joelho, maquiagem pouca e suficiente. Ela esperava. E eu me perguntava quem ela esperava. Um filho, marido, namorado? Ou um mero cliente? Não me engano, há dezenas de histórias fantásticas em aeroportos, mas da mesma forma há dezenas de histórias monótonas e corriqueiras. (onde eu quero chegar eu não sei, mas vamos escrevendo que sai alguma coisa).
O terceiro grupo de Homo Sapiens que eu observava era uma mãe e três filhos, moleques entre 12 e 15 anos. Eram árabes, e deviam esperar o pai, por suposição. Pensava eu: “pobre mulher que é obrigada a usar véu. Que vida reprimida e não vivida”. As bandeirinhas se agitam mais uma vez. Não, ainda não. A mulher de saia contorcia o pescoço e fatigava seus músculos oculares. Ela parecia só. Me aparece então a quarta pessoa, um rapaz de uns 25 anos, bem apessoado, claramente não dinamarquês. Também esperava alguém.
E eu então me disciplinei automaticamente a observar estes quatro grupos de pessoas por mera curiosidade. Como quem pega um filme no meio, e tenta entendê-lo somente com o final, sem ter visto o começo. O filme se mostrou não-hollywoodiano. Não houve explosões, nem mortes, nem alagamentos. Não houve desmaios, nem escândalos. Aconteceram momentos bonitos e sutis, que se não observados com atenção, passam desapercebidos. E são nestes momentos onde a emoção é tímida que eu me identifico, que eu percebo que não é novela nem filme. São Homo Sapiens de verdade, com estrias e rugas. O fundo não é um vale esverdeado italiano, é uma lixeira suja e um policial cutucando o nariz. É real. Isso é verdadeiramente emocionante.
A mulher de saia se levanta, seu marido (suponho) chega de terno e gravata, com uma maleta na mão, lhe dá um abraço lento. Um cheira o outro. Olham-se de perto, sorriem. Não se beijam. Saem de braços cruzados sem dizer uma palavra, nitidamente felizes.
O rapaz bem apessoado não demosntra muita emoção, quando sua mãe, pai e irmã mais nova chegam. São de origem humilde. Ele provavelmente veio de um país pobre para fazer a vida na Dinamarca, e a família veio visitar depois de muito tempo (continuo supondo). O rapaz parecia ter se dado bem, se vestia bem, usava gel no cabelo, era o membro mais alto da família. A mãe passava a mão no rosto do rapaz com um olhar de muito orgulho. O pai sorria e não passava sentimentos ocultos, estava feliz por ver o filho, simples assim. Mas a irmã com uns 13 anos de idade me emocionou de verdade. Talvez porque a sua reação foi a mais tímida de todas, mas também a mais incontrolável. Ela olhava o irmão bonito e alto, seus olhos desaguavam águas por mais que ela tentasse escondê-las. O sorriso no rosto estava firmado como concreto. Estava claro que ela tinha perdido qualquer controle sobre suas emoções. E ainda assim, os dois se abraçaram controladamente. Anos de distância os fizeram estranhos um ao outro. Não sei se eu soube passar direito a cena, mas pra mim foi muito emocionante assistir aquela menina tentando domar suas reações sem nenhum sucesso.
Já a família árabe começa a correr ao ver o pai chegando. Em pouco tempo ele tem três moleques pendurados em seus ombros pernas e etc. Os meninos se agarram ao pai como macacos em uma árvore. A pasta cai no chão. A mulher árabe observa serenamente a cena enquanto caminha em direção ao marido. A meninada abre espaço e o casal se abraça e se beija de maneira que não deixa dúvidas que ali existe amor. Uma cena mais clichê que esta é impossível. E me fez pensar como eu fui estúpido em pensar que as pessoas que usam véu na cabeça não amam.
Eu embarquei. Não cheguei a ver a chegada do soldado. Uma pena, teria sido interessante.
Este é mais um texto sem propósito, como podem perceber.
De qualquer forma eu recomendo o hábito de observar os outros. É muito bom observar as sutililezas alheias. Me faz sentir dentro do grupo dos Homos Sapiens, que são bem diferentes dos filmes. Não é preciso fundos musicais, nem a luz certa. As frases são espontâneas e as testas suadas brilham. Não há explosões de emoções, há o detalhe. Não há finais felizes nem grandes finalles. Voilà um reality show que vale a pena assistir.
Pois bem. Eu acho fantástico lugares como aeroportos, rodoviárias, estações de trem e similares. Neste espaço físico dentro da cidade acontece milhares de cenas de novelas todos os dias. Encontros, desencontros. Milhares de pessoas chegam para uma nova vida, sabendo que nunca mais verão suas famílias. Se repararmos as pessoas nesses lugares, muitas estão olhando para o teto, para os carros, para as outras pessoas, contemplando aquele que pode ser seu novo lar para o resto da vida. “é que quando eu cheguei por aqui / eu nada entendi...” (Sampa de Caetono Veloso). Ou o contrário, alguns respiram seus últimos minutos daquela que foi sua casa desde moleque. Aeroportos e Cia são um banquete pra quem gosta de olhar pessoas. Eu gosto. É uma mina de acontecimentos fantásticos, dramáticos, corriqueiros, secos e molhados.
Mais emocionantes que ver alguém se despedir introspectivamente da terra natal ou de descobrir com olhos de criança uma nova vida, são as despedidas e os reencontros de pessoas com pessoas. No caso particular de Kastrup eu vi algumas cenas que se fixaram na minha memória espontâneamente. Vou descrever quatro. Seria mais apropriado na verdade chamar estas cenas de curtas-metragem. Isto porque são sequências de cenas que culminam em um final.
Nas 4 horas que eu deveria penosa e humildimente esperar para embarcar comecei a matar meu tempo olhando para seres humanos. A primeira pessoa que eu reparei foi um militar dinamrquês que iria recepcionar um outro militar dinamarquês que chegava do Iraque. Sim, a Dinamarca tem tropas no Iraque. Este militar dava uma entrevista à uma reporter em inglês e dizia ladainhas que não fiz questão de escutar. Do outro lado do saguão umas 40 pessoas esperavam o tal soldado chegar, cada uma delas com uma bandeirinha da Dinamarca na mão, que podia ser comprada por cerca de 30 Coroas Dinamarquesas (uns R$ 10) na banca ao lado. Creio que eram família e amigos. Faziam balbúrdia toda vez que uma leva de Homo Sapiens saia fresquinha do forno. Mas não, ainda não. Entre repórteres e bandeirinhas havia uma mulher, de cerca de 50 anos de idade, sentada, atenta ao saguão de desembarque. Já esperava havia tempo longo. Estava bonita, bem arrumada, mas nada demasiado, estava elegante. Usava uma saia até o joelho, maquiagem pouca e suficiente. Ela esperava. E eu me perguntava quem ela esperava. Um filho, marido, namorado? Ou um mero cliente? Não me engano, há dezenas de histórias fantásticas em aeroportos, mas da mesma forma há dezenas de histórias monótonas e corriqueiras. (onde eu quero chegar eu não sei, mas vamos escrevendo que sai alguma coisa).
O terceiro grupo de Homo Sapiens que eu observava era uma mãe e três filhos, moleques entre 12 e 15 anos. Eram árabes, e deviam esperar o pai, por suposição. Pensava eu: “pobre mulher que é obrigada a usar véu. Que vida reprimida e não vivida”. As bandeirinhas se agitam mais uma vez. Não, ainda não. A mulher de saia contorcia o pescoço e fatigava seus músculos oculares. Ela parecia só. Me aparece então a quarta pessoa, um rapaz de uns 25 anos, bem apessoado, claramente não dinamarquês. Também esperava alguém.
E eu então me disciplinei automaticamente a observar estes quatro grupos de pessoas por mera curiosidade. Como quem pega um filme no meio, e tenta entendê-lo somente com o final, sem ter visto o começo. O filme se mostrou não-hollywoodiano. Não houve explosões, nem mortes, nem alagamentos. Não houve desmaios, nem escândalos. Aconteceram momentos bonitos e sutis, que se não observados com atenção, passam desapercebidos. E são nestes momentos onde a emoção é tímida que eu me identifico, que eu percebo que não é novela nem filme. São Homo Sapiens de verdade, com estrias e rugas. O fundo não é um vale esverdeado italiano, é uma lixeira suja e um policial cutucando o nariz. É real. Isso é verdadeiramente emocionante.
A mulher de saia se levanta, seu marido (suponho) chega de terno e gravata, com uma maleta na mão, lhe dá um abraço lento. Um cheira o outro. Olham-se de perto, sorriem. Não se beijam. Saem de braços cruzados sem dizer uma palavra, nitidamente felizes.
O rapaz bem apessoado não demosntra muita emoção, quando sua mãe, pai e irmã mais nova chegam. São de origem humilde. Ele provavelmente veio de um país pobre para fazer a vida na Dinamarca, e a família veio visitar depois de muito tempo (continuo supondo). O rapaz parecia ter se dado bem, se vestia bem, usava gel no cabelo, era o membro mais alto da família. A mãe passava a mão no rosto do rapaz com um olhar de muito orgulho. O pai sorria e não passava sentimentos ocultos, estava feliz por ver o filho, simples assim. Mas a irmã com uns 13 anos de idade me emocionou de verdade. Talvez porque a sua reação foi a mais tímida de todas, mas também a mais incontrolável. Ela olhava o irmão bonito e alto, seus olhos desaguavam águas por mais que ela tentasse escondê-las. O sorriso no rosto estava firmado como concreto. Estava claro que ela tinha perdido qualquer controle sobre suas emoções. E ainda assim, os dois se abraçaram controladamente. Anos de distância os fizeram estranhos um ao outro. Não sei se eu soube passar direito a cena, mas pra mim foi muito emocionante assistir aquela menina tentando domar suas reações sem nenhum sucesso.
Já a família árabe começa a correr ao ver o pai chegando. Em pouco tempo ele tem três moleques pendurados em seus ombros pernas e etc. Os meninos se agarram ao pai como macacos em uma árvore. A pasta cai no chão. A mulher árabe observa serenamente a cena enquanto caminha em direção ao marido. A meninada abre espaço e o casal se abraça e se beija de maneira que não deixa dúvidas que ali existe amor. Uma cena mais clichê que esta é impossível. E me fez pensar como eu fui estúpido em pensar que as pessoas que usam véu na cabeça não amam.
Eu embarquei. Não cheguei a ver a chegada do soldado. Uma pena, teria sido interessante.
Este é mais um texto sem propósito, como podem perceber.
De qualquer forma eu recomendo o hábito de observar os outros. É muito bom observar as sutililezas alheias. Me faz sentir dentro do grupo dos Homos Sapiens, que são bem diferentes dos filmes. Não é preciso fundos musicais, nem a luz certa. As frases são espontâneas e as testas suadas brilham. Não há explosões de emoções, há o detalhe. Não há finais felizes nem grandes finalles. Voilà um reality show que vale a pena assistir.
lundi 7 janvier 2008
Ilha das Flores
Pra quem se interessar. Vale a pena pra quem tiver algum valioso tempo sobrando. Esse curta foi feito em 1989 e já nasceu atemporal e/ou eterno. Por Jorge Furtado. Dividido em duas partes :
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